ATA DA QUADRAGÉSIMA OITAVA SESSÃO SOLENE DA TERCEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA TERCEIRA LEGISLATURA, EM 25-11-2003.

 

 


Aos vinte e cinco dias do mês de novembro de dois mil e três, reuniu-se, no Plenário Otávio Rocha do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre. Às dezenove horas e vinte e oito minutos, constatada a existência de quórum, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos da presente Sessão, destinada à entrega do Título Honorífico de Cidadão Emérito ao Senhor José Paulo Bisol, nos termos do Projeto de Resolução nº 047/03 (Processo nº 2400/03), de autoria do Vereador Juarez Pinheiro. Compuseram a MESA: o Vereador João Antonio Dib, Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; o Senhor João Verle, Prefeito Municipal de Porto Alegre; o Desembargador Osvaldo Stefanello, representante do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul; o Senhor Jefferson Miola, Delegado Regional do Ministério do Desenvolvimento Agrário, representante do Senhor Ministro do Desenvolvimento Agrário; o Capitão-Tenente Leandro de Oliveira Pires, representante da Delegacia da Capitania dos Portos; o Senhor Davi Stival, Presidente Estadual do Partido dos Trabalhadores; o Senhor Eduardo Viana Pinto, representante do Conselho de Cidadãos Honorários de Porto Alegre; o Senhor José Paulo Bisol, Homenageado; o Vereador Juarez Pinheiro, na ocasião, Secretário “ad hoc”. Ainda, foram registradas as presenças do Senhor Raul Pont, ex-Prefeito Municipal de Porto Alegre, e do ex-Vereador Clovis Ilgenfritz. A seguir, o Senhor Presidente convidou a todos para, em pé, ouvirem a execução do Hino Nacional e, em continuidade, concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Vereador Juarez Pinheiro, em nome das Bancadas do PDT, PP, PTB, PMDB, PPS, PSB e PCdoB, discorreu sobre a trajetória de vida do Senhor José Paulo Bisol, afirmando que o Título hoje entregue representa o reconhecimento dos porto-alegrenses à atuação do Homenageado na busca da construção da democracia brasileira e em prol do desenvolvimento político e cultural da Cidade. Em prosseguimento, o Senhor Presidente registrou a presença do Senhor Olívio Dutra, Ministro das Cidades, convidando Sua Excelência a integrar a Mesa dos trabalhos. Também, registrou a presença da Senhora Helena Bonumá, Secretária Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana. Após, foi dada continuidade às manifestações dos Senhores Vereadores. A Vereadora Margarete Moraes, em nome da Bancada do PT, declarou que o Senhor José Paulo Bisol conseguiu unir a beleza à compreensão do mundo, sendo uma personalidade polêmica e corajosa, que nunca abriu mão de seus princípios de respeito, civilidade e amor à Pátria e sempre se colocou ao lado da defesa da vida e da dignidade do homem. O Vereador Cláudio Sebenelo, em nome da Bancada do PSDB, analisou a sociedade atual como um momento em que certezas estão sendo reavaliadas em todas as áreas, ressaltando que o Homenageado é um símbolo de esperança e um exemplo de trabalho incansável pela construção de uma sociedade que aceite e integre as diferenças inerentes ao ser humano. A seguir, o Senhor Presidente concedeu a palavra aos Senhores João Verle e Olívio Dutra, que, saudando os presentes, afirmaram a justeza do Título hoje entregue pela Câmara Municipal de Porto Alegre ao Senhor José Paulo Bisol. Na ocasião, o Senhor Presidente registrou o recebimento de correspondências alusivas à presente solenidade, enviadas pelo Deputado Federal Henrique Fontana, pelo Deputado Estadual Ivar Pavan e pelo Senhor Márcio Souza, da Secretaria Especial do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Em continuidade, o Senhor Presidente convidou o Senhor João Verle e o Vereador Juarez Pinheiro a procederem à entrega do Título Honorífico de Cidadão Emérito ao Senhor José Paulo Bisol, concedendo a palavra a Sua Senhoria, que agradeceu o Título recebido. Após, o Senhor Presidente convidou os presentes para, em pé, ouvirem a execução do Hino Rio-Grandense e, nada mais havendo a tratar, agradeceu a presença de todos e declarou encerrados os trabalhos às vinte e uma horas e quatro minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador João Antonio Dib e secretariados pelo Vereador Juarez Pinheiro, como Secretário "ad hoc". Do que eu, Juarez Pinheiro, Secretário "ad hoc", determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada pela Senhora 1ª Secretária e pelo Senhor Presidente.

 

 


O SR. PRESIDENTE (João Antonio Dib): Estão abertos os trabalhos da presente Sessão Solene, destinada a homenagear o mais novo Cidadão Emérito de Porto Alegre, o ex-Senador, o ex-Secretário de Estado, Deputado Estadual José Paulo Bisol. Compõem a Mesa: o Dr. Jefferson Miola, Delegado Regional do Ministério do Desenvolvimento Agrário, representando, neste ato, o Ministro do Desenvolvimento Agrário; o Desembargador Osvaldo Stefanello, representante do Tribunal de Justiça do Estado; o Dr. João Verle, ilustre Prefeito Municipal de Porto Alegre; o Sr. Davi Stival, Presidente Estadual do Partido dos Trabalhadores; o Capitão-Tenente Leandro de Oliveira Pires, representante da Delegacia da Capitania dos Portos; o Dr. Eduardo Viana Pinto, representante do Conselho de Cidadãos Honorários de Porto Alegre. Registro as presenças do ex-Prefeito Raul Pont; do ex-Presidente desta Casa, Clovis Ilgenfritz; Srs. Deputados Estaduais; Srs. Secretários Municipais; senhores representantes do Corpo Consular; Sras. Vereadoras e Srs. Vereadores; demais autoridades presentes; senhores da imprensa, senhoras e senhores. Informo que o ex-Governador e atual Ministro das Cidades, Sr. Olívio Dutra, está-se dirigindo para este plenário.

Convidamos a todos os presentes para, em pé, ouvirmos o Hino Nacional.

 

(Ouve-se o Hino Nacional.)

 

Eu gostaria de dizer que, nos últimos 15 dias, esta Casa ficou um pouco caxiense. Há 15 dias, o Senador Pedro Simon foi homenageado com o Título de Cidadão de Porto Alegre. Na sexta-feira passada, o Senador Paulo Paim recebeu o Título Zumbi dos Palmares, e é caxiense. Hoje, o nosso homenageado, José Paulo Bisol, não é caxiense, mas é meu contemporâneo de ginásio. O Bisol, o Senador Simon e eu estudamos no Ginásio do Carmo. Então, mesmo eu não tendo nascido em Caxias, eu tenho muito apreço por aquela Cidade. Eu sinto que a nossa Casa do Povo de Porto Alegre está ficando um pouco caxiense, o que é muito bom.

Eu aprendi a admirá-lo como orador no Ginásio do Carmo. Ao longo da minha vida pública, houve um momento que me marcou profundamente, quando José Paulo Bisol era o Deputado Estadual e eu era o Prefeito de Porto Alegre. Ele recebeu uma denúncia circunstanciada, com muitas assinaturas em relação ao Departamento de Esgotos Pluviais. Pediu para marcar uma hora com o Prefeito, e levou a mim o material que ele tinha e disse: “Dib, eu sei que se houver alguma coisa errada tu vais verificar, se não houver, nós dois vamos ficar contentes”. Na realidade, não tinha, não se fez injustiça para ninguém e se proclamou a verdade.

Mas, quem tem que fazer a homenagem, em primeiro lugar, em nome da Casa do Povo de Porto Alegre, é o proponente. O Ver. Juarez Pinheiro, proponente desta homenagem, está com a palavra.

 

O SR. JUAREZ PINHEIRO: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Esta Sessão Solene, convocada para outorga a José Paulo Bisol, com o Título de Cidadão Emérito, além de justa, tem imenso sentido.

Hoje, Porto Alegre homenageia, com um pouco de retardo, de um lado, a uma das maiores inteligências já produzidas por esta terra; de outro, um dos seus filhos de maior lucidez e contribuição na luta por um outro tipo de sociedade, mais fraterna, justa e solidária.

Caro Bisol, hoje estão aqui, representando milhares, alguns dos porto-alegrenses e brasileiros que, ao longo do tempo, têm sido abraçados por ti, através da tua palavra, da tua lucidez e da tua coragem.

Permita, Bisol, hoje somos nós que queremos te abraçar. Logicamente, sem a força dos teus abraços e o brilho das tuas palavras, mas com muita sinceridade, carinho e respeito.

Queremos abraçar aquele que diz o que não sabemos, que diz o que não temos coragem ou que não sabemos elaborar.

Queremos abraçar aquele que nos diz sim à vida, não a qualquer vida, mas a uma vida com sentido.

Queremos abraçar aquele que ora embala os nossos sonhos com a sua candura e poesia, e ora nos defende com palavras fortes e punhos de ferro.

Queremos abraçar aquele que, como ninguém, denuncia a hipocrisia dos que tentam amordaçar a verdade e a justiça. Aquele que, como ninguém, sabe levantar o véu estrategicamente colocado pelas elites para que não venhamos a compreender nossa realidade, evitando as transformações.

Queremos abraçar aquele que nunca se entrega, que acredita na transformação, que não abre mão das utopias, que acredita no vir a ser. Um homem que é do seu tempo e também é do tempo futuro.

Queremos abraçar o ser humano sempre apaixonado pela vida, incompreendido e injustiçado muitas vezes e que, com tolerância e compreensão, a todos perdoa. Queremos abraçar o Bisol, filho de carroceiro e da Dona Maria. O Bisol menino pobre que, desde cedo, se obrigou a trabalhar para poder estudar e que, mesmo assim, escolheu para si o melhor lado da vida. Queremos abraçar o poeta e o intelectual, que, no florescer da juventude, com o Paulo Hecker e o Lineu Dias, fundou a revista Crucial, revista que, nos anos cinqüenta, se destacou no ambiente literário da época por sua natureza vanguardista e ousada.

Queremos abraçar o estudante de Direito que desde a juventude, como diz o seu melhor amigo Paulo Hecker, “queria saber tudo”. Que na faculdade tinha como um dos seus amigos permanentes Synval Guazzelli, com quem lia filosofia, política, poesia, Ortega, Nietzsche, Dostoievski, Mário de Andrade, Octávio de Faria. Queremos abraçar o Bisol que na busca do emprego tentou o Rio de Janeiro, de lá só retornando para tirar o primeiro lugar no concurso de Juiz de Direito. Queremos abraçar o Bisol meio-campista de qualidade e gremista apaixonado. O pai do Jairo, do Ricardo, da Tula, o companheiro da Vera. O Bisol dos amigos Paulo Hecker Filho, Resende e do Synval, que infelizmente já nos deixou.

O Bisol Juiz, Desembargador Stefanello, que com imenso senso de observação, inteligência e memória, proferia sentenças tão logo terminavam as audiências, e V. Exa. sabe o quanto isso é difícil. Que sempre mantinha os processos em dia e ainda arrumava tempo para lecionar. Que colocou em risco sua carreira de Juiz ao transportar, no porta-malas do seu carro, quando do golpe de 64, militantes leais a João Goulart, de Livramento para Rivera.

O Bisol que, por merecimento, foi galgado ao cargo de Desembargador e, por vontade popular, foi eleito Deputado Estadual, Senador. Que teve desempenho decisivo na denúncia de corrupções que redundaram no impeachment de Collor.

Senhores e senhoras, enquanto apenas uma minoria consegue alguma projeção na sua área específica, Bisol brilhou em tantos campos da produção humana que é impossível não sermos tomados por um pequeno sentimento de inveja diante da constatação de tamanha concentração de qualidades elevadas num único homem. Mas esse pequeno sentimento humano logo se esvai e se transforma na mais ampla admiração ao percebermos a generosidade com que Bisol, ao longo de sua trajetória, tem brindado a sociedade com o que tem de melhor. Entre tantos exemplos de sua dedicação e generosidade, podemos citar a participação destacada na luta pelos direitos humanos e pela redemocratização do País. O episódio do impeachment de Collor; a construção das candidaturas, companheiro Raul, de Lula nas campanhas de 1989 e 1994, sendo, nessa última, alvo de campanha insidiosa, cuja falsidade ficou comprovada na Justiça; e, mais proximamente, a sua atuação frente à Secretaria de Justiça e Segurança do Estado, onde demonstrou toda a sua bravura e retidão no enfrentamento dos grandes interesses que corroíam essa tão importante estrutura para o estado democrático de direito.            

Companheiro Quintino, Presidente da CUT, sobre esse último episódio, cabe-nos determos um pouco mais, pois sua importância ainda não tem recebido o devido reconhecimento. Sem dúvida, um dos grandes desafios da modernidade é o enfrentamento da violência e da criminalidade. No Brasil, podemos dizer, de forma simplificada, que essa problemática combina três aspectos: primeiro, o aspecto relativo à miséria e vergonhosa desigualdade social, que contribui, sobremaneira, para os índices de violência e de criminalidade; um segundo, relativo à cultura autoritária e ao atraso na construção da cidadania, que se expressa nos baixos salários dos servidores públicos, na falta de uma consciência de direitos humanos e na violência policial; e, terceiro, na amplitude do crime organizado e seu enraizamento nas esferas do Estado. Esse último aspecto, relativo ao crime organizado, não é patrimônio exclusivamente brasileiro, pois se estima que o crime organizado movimente, aproximadamente, um quarto do dinheiro em circulação no mundo, mas, em nosso País, esse tipo de criminalidade assumiu maiores proporções em decorrência das fragilidades do Estado.

Bisol demonstrou coragem e enfrentou essa perigosa tarefa e os grandes interesses envolvidos lutando bravamente pela construção de uma segurança pública democrática, cidadã, incorruptível, dando mais uma inestimável contribuição para o avanço da sociedade e construção do estado democrático de direito.

Vemos, por essa breve retomada de alguns momentos marcantes da vida de Bisol, que a sua trajetória se confunde com a história das grandes lutas políticas e sociais em nosso Estado e no País nas últimas décadas. Na trajetória de vida de José Paulo Bisol, encontramos alguns dos momentos mais belos e generosos da história, pela construção, Ver. Raul Carrion, de uma nova sociedade.

Este é o sentido desta homenagem. Nada mais justo do que, por meio deste reconhecimento público, reafirmarmos os melhores valores que dão sentido à existência da nossa comunidade, e, assim, fazendo, mais uma vez, esses valores pulsarem em toda a sua intensidade.

Prestar uma homenagem - mais do que olhar para o passado - é nele reconhecer a relevância da contribuição de uma pessoa, é apontar para o futuro e afirmar os valores que, a nossa frente, nos orientam. A presença de cada um, de cada uma, nesta homenagem, constitui-se mais um momento de afirmação dos valores que orientam a construção de um novo mundo possível.

“Dr. Bisol”, não é assim que o povo o chama? Esta homenagem, na qual, de forma pálida, traçamos uma síntese de tua trajetória e principais ações, não tem o objetivo de te liberar, no máximo, pode significar uma pausa. Precisamos muito da tua luz para iluminar os nossos caminhos, principalmente nos dias de hoje, caracterizados pelo belicismo, pelo unilateralismo, pelas desigualdades sociais e pela tese do livre comércio, que só faz os ricos ficarem mais ricos, e os pobres ficarem mais pobres, quando julgamentos levam em consideração a lei de mercado e não o direito, quando vale mais ter do que ser.

Nós nos orgulhamos e precisamos que continues conosco, José Paulo Bisol, Cidadão Emérito de Porto Alegre!

Eu quero agradecer ao Presidente o tempo a mais que foi permitido ao propositor desta homenagem, e dizer que nos honra muito, neste momento – e o aguardávamos –, a presença entre nós do Ministro das Cidades, Olívio Dutra, ex-Governador do Estado do Rio Grande do Sul. (Palmas.)

Nesse sentido, queremos agradecer ao Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, Ver. João Antonio Dib, que permitiu que pudéssemos atrasar um pouco esta cerimônia para que o nosso Ministro, ex-Governador, pudesse dela participar na sua inteireza. O Ministro acaba de chegar, neste momento, de Brasília, vindo, especialmente para dar aqui o abraço no seu ex-Secretário de Justiça e Segurança. Muito obrigado, ex-Governador, Ministro das Cidades, companheiro de sempre, Olívio Dutra. Viva o Bisol! Viva o Olívio! Viva uma sociedade mais justa! (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Antonio Dib): A Casa anuncia com satisfação a presença, que já havia sido anunciada, do Ministro das Cidades, ex-Governador do Estado, ex-Prefeito da Capital, Dr. Olívio Dutra. Registro a presença, além dos Vereadores que ocuparão a tribuna, do Ver. Carlos Pestana, do Ver. Marcelo Danéris, do Ver. Zé Valdir, da Ver.ª Maristela Maffei, do Ver. Raul Carrion e da Ver.ª Helena Bonumá, que é a nossa Secretária de Direitos Humanos e Segurança.

A Ver.ª Margarete Moraes está com a palavra e falará em nome da Bancada do Partido dos Trabalhadores.

 

A SRA. MARGARETE MORAES: Sr. Presidente, Sras. Vereadoras e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Companheiro Raul Pont; Exmo Srs. Secretários Municipais, representados na figura da querida Helena Bonumá; também quero fazer uma referência à presença do Presidente da CUT, o nosso companheiro Quintino, eu confesso que é muito difícil abordar - no tempo regimental, mas também fora deste -, porque não é nada fácil produzir uma síntese que seja capaz de traduzir a grandeza e a riqueza da figura do José Paulo Bisol - eu peço licença para chamá-lo assim -, porque seja na condição de desembargador, de poeta, de político, de comunicador, de velho companheiro das lutas da esquerda, de militante, em quaisquer dos aspectos ou das facetas que ele resolva porventura trabalhar na vida, ele sempre se dedica com muito talento, com muito comprometimento e muita propriedade. Essa minha dificuldade aumenta depois do discurso do companheiro Juarez Pinheiro e também de um texto produzido pelo Paulo Hecker Filho, a pedido do companheiro Juarez Pinheiro, que justificou a Exposição de Motivos. O Paulo Hecker Filho, por sua vez, é poeta, é um crítico de dança, um crítico de literatura ensaísta dos mais rigorosos possíveis. Mas eu vou me arriscar em poucos aspetos, que eu considero mais marcantes e muito me emocionam, e que certamente diz respeito ao manejo e ao encanto que o José Paulo Bisol tem com as palavras, ele busca a perfeição. Quem ouve o Senador Bisol remete-se muito além de si mesmo, certamente amplia a sua visão de mundo e suas expectativas. Quem ouve José Paulo Bisol consegue alterar concepções de mundo; isso é muito importante. Mesmo quando José Paulo Bisol envereda pela veia poética, por essa veia que ele trabalha tão bem, ele jamais esquece os direitos que garantem e que protegem as pessoas; que garante e que protegem a vida, do ponto de vista coletivo ou individual; e essa é outra marca perene do Senador Paulo Bisol. Ao trilhar os caminhos da imaginação e do sonho, ele une a beleza e a estética à compreensão da vida e nunca consegue contrapor ética e estética. Quando lembramos do Bisol, imediatamente surge uma imagem, a imagem que é lembrada cotidianamente pelos companheiros da Frente Popular desta Casa quando defendem, com muita garra e muito orgulho, o trabalho da Secretaria da Segurança no nosso Estado. E aqui eu quero lembrar de todos os Vereadores do PT e da Frente Popular e citar, principalmente o companheiro Zé Valdir, companheiro Juarez, companheira Maristela, que lembram cotidianamente desse trabalho como um exemplo nessa área. Mas vem a imagem da figura polêmica, da figura corajosa, da figura generosa que não abre mão dos seus sólidos princípios e que nunca se furta de colocar todo o seu talento, todo o seu conhecimento, a sua sofisticada elaboração de tantos anos por uma consciência social mais lúcida, mais perspicaz. Também coloca toda a sua paixão, seu desgarramento, sua disponibilidade em defesa da vida, desta vida que deve ser digna de ser vivida por todos e por todas as pessoas, independendo das circunstâncias, seja a condição social, o grau de instrução, o local de moradia, a orientação sexual, quaisquer outras circunstâncias.

José Paulo Bisol já tem o reconhecimento justo. Já tem o reconhecimento justo em Porto Alegre, no Brasil, muito além-fronteira. Ele já tem um legado, um legado de dignidade, de respeito, de civilidade, de amor à Pátria. Mas não se pense jamais que ele tem a sua missão cumprida.

Quero dizer, com muito respeito, que o José Paulo Bisol tem muito o que dizer, tem muito o que ensinar e tem muito o que realizar ainda. E nós queremos continuar contando com a sua presença marcante. Portanto, em nome da Bancada do PT, do Partido dos Trabalhadores, a quem eu tenho orgulho de representar neste momento, eu quero dizer que é muito significativo para nós termos companheiros do porte do Ver. Juarez Pinheiro, responsável por esta proposição, por esta belíssima e justa idéia, alguém que é sempre bom saber que está por perto aqui na Câmara de Vereadores, grande companheiro Juarez. É uma honra muito grande procedermos à entrega do Título Honorífico de Cidadão Emérito ao José Paulo Bisol, que só eleva a Câmara de Vereadores, a Cidade e o nosso País, porque se trata de um homem que é símbolo, que é um símbolo da nossa esperança, que é um símbolo da boa energia. Embora esta fala seja muito difícil, porque extremamente emocionada, é como se ele dissesse às novas gerações: “Sonhe, aposte no lúdico, seja utópico. Vá em busca, construa o seu destino, porque sempre vale a pena”. Muito obrigada. (Palmas.)

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Antonio Dib): O Ver. Cláudio Sebenelo está com a palavra e falará em nome do seu Partido, o PSDB.

 

O SR. CLÁUDIO SEBENELO: Exmo. Sr. Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, Ver. João Antonio Dib, Srs. Vereadores e Sras. Vereadoras. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Saúdo especialmente o Exmo. Sr. Dr. Desembargador, Senador José Paulo Bisol.

Eu sei que esta é uma festa do Partido dos Trabalhadores. Eu peço desculpas ao Ver. Juarez Pinheiro, mas o espírito com que eu vim aqui não foi um espírito invasivo; foi um espírito de fraternidade e de agradecimento a essa figura fantástica que hoje é homenageada. Eu falo em nome do Partido da Social Democracia Brasileira, da forma mais fraterna, mais amiga possível.

Eu queria cumprimentar o Ver. Juarez Pinheiro pela iniciativa brilhante, competente, que traz a esta Casa o que raramente esta Casa tem a oportunidade de homenagear: o fulgor de um dos maiores repositórios de saber, de sensibilidade e de incrível experiência de vida, incluindo-se passagens definitivas pelo Executivo, pelo Legislativo e pelo Judiciário. Por isso, esta Cidade e seu imaginário flutuam feito plumas, soltos, felizes porque uma das suas mais ilustres inteligências passa a ser, cartorialmente, de papel passado, emérito filho de suas ruas, de seus becos, praças, esquinas, ruelas e botecos.

Às vezes tenho dificuldade no tratamento que vou conceder a certas pessoas. O que mais me embevece e me encanta é quando numa apresentação no Olímpia, em Paris, a nossa Elis Regina apresentava o quinteto que lhe fazia o acompanhamento musical, e uma das estrelas da noite, com quem divida o palco, apenas e não menos do que Vinícius de Moraes, caracterizou Elis como poète e diplomat. Que magnífica apresentação de um nome e suas aptidões!

 Pois mais do que nunca, o nosso emérito de hoje, pela sua sensibilidade, pela sua motricidade fina aplicada à palavra – como disse muito bem a Ver.ª Margarete Moraes -, sem plágio ou qualquer juízo de valor, tem a estética do poeta e o macio imprescindível do diplomata.

Nós todos curtimos um privilégio indescritível de termos visto jogar Pelé, de Pavarotti cantar, de Einstein proferir sua teoria, de presenciar a explosão tecnológica da humanidade em proporções logarítmicas. E foram caindo, um a um, muitos dos mitos e dogmas; e com eles fomos testemunhas da profunda alteração do comportamento do homem transformando a natureza – muitas vezes até demais, destruindo-a .

Fomos educados, em meados do século XX, com a exatidão dos ábacos, com a decoreba dos afluentes do Amazonas, dos dois lados, e até hoje não consegui nenhuma aplicação prática para o Teorema de Varignon, que fui obrigado a estudar e decorar para o vestibular, ou para o Teorema de Pitágoras - num triângulo retângulo, o quadrado da hipotenusa é igual à soma do quadrado dos catetos. Nossa educação foi presidida pela certeza. A obediência era prima-irmã do inquestionável, sob o império das ciências exatas.

Entre outros privilégios, fomos testemunhas de algumas revoluções que estão expressas na obra de um dos maiores pensadores da humanidade. Trata-se de “O Fim das Certezas”, onde seu autor, prêmio Nobel de Física, Ilya Prigogine, decreta, ironicamente, a partir de uma ciência exata - a Física - o obituário das certezas, partindo de raciocínios da especialidade, como o primeiro Princípio da Termodinâmica.

Permitiu-se extrapolar os conceitos para outras ciências, inclusive as humanas, e passamos a viver a plena era das incertezas, ou melhor, todas as certezas passam a ser questionáveis. Ninguém é dono da razão. Ninguém tem o monopólio da verdade. Ninguém é exclusivista de conceitos irreversíveis.

Desde Galileu Galilei, condenado a tomar cicuta pela Inquisição, mas era o portador da verdade, até os modernos condensadores, inclusive da nossa Teoria da Relatividade, das questões de tempo e espaço, até o fato de se definir uma reta em geometria como uma curva, paradoxo máximo, porém, de raio tendendo dimensões infinitas.

Essa seqüência de eventos nos garante a possibilidade de aplicar a outras ciências, sistemicamente, como queria Ludwig Von Bentalanfy, a perda de nossas convicções, especialmente as questões polêmicas.

E, nas revoluções que presenciamos, e mais fortemente nas relações humanas, na Sociologia, no Direito, na Medicina e nas Comunicações, ninguém está tão definitivamente certo, nem tão definitivamente errado.

E é na nobreza dessa aceitação que gostaríamos de encaixar as participações dos homens públicos como José Paulo Bisol - da incerteza presidindo o trabalho dos homens públicos que dirigem, decidem, conduzem seus barcos, muitas vezes à deriva. E talvez aí é que se possa fazer a luz.

José Vicente Tavares dos Santos é professor da UFRGS e trabalha no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas no grupo Violência e Cidadania. Dá uma entrevista à revista Entrelinhas, cujo título é “Ordem é Uma Tarefa Impossível”. E a repórter pergunta: “Qual o papel dos governos nessa estrutura?” “A complexidade do problema”, responde ele, “exige nova formação, na qual as dimensões psicanalíticas e psicológicas" - Dr. Bruno Costa - "são fundamentais nesse processo, principalmente porque envolve pessoas em constante risco de vida e que podem colocar vidas em risco.” Esse ponto de vista até há muito pouco não existia na formação de policiais que têm de ser, ao mesmo tempo, mediadores de conflitos, agentes dos direitos humanos, além de ser um profissional eficiente na prevenção e repressão ao crime”.

Outra resposta ele dá: “Quando a nossa Bandeira fala em ordem e progresso, hoje esses valores já se despedaçaram, ninguém mais sabe o que é ordem, o que é progresso; a grande frustração dos jovens é que a escola significava prestígio, emprego - e hoje nós vivemos no desemprego -, salário, sucesso no amor e alegria no viver. A violência na escola é a condensação de toda a conflitualidade social que lá explodem, porque ela está presente no momento da maior crise biológica e psicológica do ser humano, da passagem do jovem para o adulto. Nesse momento, a escola é incapaz de se dar conta da crise social e pessoal. O conceito de violência usado por Pierre Bourdieu fala de uma violência que é a demissão do exercício da função de educar para a vida, e não somente ensinar Português, Matemática...”.

E como o Senhor pensa que deve ser a recuperação das instituições? - Acho que a violência na escola deve ser tema de estudos sociológicos, porque ela, a violência, faz pensar o quanto as instituições sociais estão em crise.

 A violência que ocorre no Direito de Família, numa questão de divórcio ou tutela de filhos esconde e concentra todos os dilemas, que são hoje do grupo familiar que vai formar a criança mesmo estando em casas separadas.

 A violência policial mostra a crise da Polícia, o desmando, a corrupção, a figura do policial que, inclusive hoje, nós homenageamos, herói, a idéia de usar a arma como um falus, uma forma de poder, apesar do quanto isso possa ser trágico.

A violência produz uma reflexão sobre a crise pós-modernidade. E nesse ponto é muito importante que seja estudada, desvelada, por mais sofrimento que isso cause, se não estaremos condenados ao realismo fantástico de García Márquez, onde ocorrem as maiores mortandades, e ninguém fala.

Há um manto de invisibilidade que provoca soluções que são patológicas, que não resolvem a dinâmica da conflitualidade. Se todos os lados do problema não forem analisados, eles serão congelados numa outra manifestação e criarão estigmas, situações patológicas, as fixações que impedem o desenvolvimento da compreensão psicanalítica do problema, tanto quanto em nível individual, quanto em nível social.

Tomara que a incerteza que nos domina seja o motor de partida da consciência de que ninguém faz milagres, que o pensamento mágico não pode comandar uma Secretaria e que a falta é a maior constante em todos os Governos. Mesmo com pessoas extremamente competentes, mesmo sem a derivada de tempo, sem uma compreensão pós-moderna, nunca chegaremos lá. Vossa Excelência fez o melhor que havia como executivo de um dos maiores enigmas de toda a humanidade, enfrentando um problema perene e cosmopolita. Esta é a maior homenagem que eu gostaria de lhe prestar, neste dia de festa, para todos nós em que a eminência de sua personalidade faz esta Cidade se tornar mais feliz, mais bonita com o Emérito na frente de seu nome, com o maior de todos os merecimentos. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Antonio Dib): Neste momento está-se realizando uma Audiência Pública que trata do Plano Diretor, por isso a Ver.ª Maristela Maffei, a Ver.ª Margarete Moraes, o Ver. Zé Valdir e o Ver. Carlos Pestana estão solicitando licença para se retirar, pedindo escusas ao homenageado e aos integrantes da Mesa.

O Prefeito Municipal de Porto Alegre Sr. João Verle está com a palavra.

 

O SR. JOÃO VERLE: Sr. Presidente, Srs. Vereadores e Sras. Vereadoras. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) José Paulo Bisol, um intelectual que não se refugiou em si mesmo, mas fez de sua vida um compromisso permanente com a democracia e as causas sociais. A opção política de José Paulo Bisol é um orgulho para todos nós, que vemos no compromisso e no engajamento um sentido para a vida, neste mundo despedaçado pela visão de que o lucro é o valor máximo e a ele devem estar subordinados todos os demais valores. Para Bisol, a Justiça não é uma abstração, mas algo concreto que pode-se tornar um bem para todos os seres humanos. Jurista, Bisol compreendeu que o Direito tem sido, na maior parte das vezes, um privilégio. Filósofo, angustiou-se com a miséria crescente e a exclusão social da grande maioria da população. Escritor, usou seu talento para colocar as palavras e as frases como armas de combate.

No Governo Democrático-Popular do Rio Grande do Sul, liderado por Olívio Dutra, não hesitou em assumir a tarefa mais espinhosa diante de tantos desafios que se colocavam para o Governo: coube-lhe a incumbência de dirigir a Secretaria de Justiça e Segurança, quando o crime crescia de maneira vertiginosa, os conflitos entre a Brigada Militar e a Polícia Civil aumentavam, cada vez maiores eram os casos de corrupção dentro dos órgãos de segurança, o narcotráfico era cada vez mais agressivo e perigoso. Mas, acima de tudo, Bisol implantou uma nova visão de política de Segurança Pública, mais democrática, contrariando privilégios e velhos interesses corporativos, direcionando a condução política da Secretaria para privilegiar a prevenção do crime, mais do que a repressão; e, principalmente, procurou unificar as ações da Brigada Militar e da Polícia Civil, acabando com os insuportáveis atritos entre ambas e que vinham-se tornando cada vez mais freqüentes.

Por todas estas razões, é justa a homenagem que hoje lhe presta a Câmara Municipal de Porto Alegre. Bisol tem uma obra literária, uma carreira jurídica, uma exemplar conduta política tanto no Parlamento como no Executivo rio-grandense e as conquistas obtidas por ele servem de modelo na reorientação da política brasileira de segurança. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Antonio Dib): O Dr. Olívio Dutra, Ministro das Cidades, está com a palavra.

 

O SR. OLIVIO DUTRA: Sr. Presidente do Legislativo de Porto Alegre, Ver. João Antonio Dib, ao saudá-lo, saúdo a Casa, a Instituição Legislativa da Capital do Rio Grande, toda a Mesa da Câmara, cada uma e cada um dos Vereadores e Vereadoras de Porto Alegre. Saudação ao meu companheiro, eminente homenageado com o Título de Cidadão Emérito de Porto Alegre, ex-Juiz, Magistrado, Deputado Estadual, Desembargador, ex-Senador da República, percorreu este País como candidato à vice-presidência da República com o companheiro Lula, hoje o Presidente do nosso País.

Para orgulho nosso, integrante da equipe do Governo da Frente Popular no Rio Grande, como Secretário da Justiça e Segurança, companheiro José Paulo Bisol.

Saudação que expresso, não só a minha, mas tenho certeza, de todos os companheiros que contigo tiveram aquela rica, densa e intensa atividade no Governo do Rio Grande, como também até mesmo de alguns dos seus adversários, que os têm encontrado por este Brasil afora, e mesmo lá em Brasília.

É também uma expressão do sentimento do Presidente da República, o companheiro Lula.

Quero, também, aqui, saudar a companheira do teu cotidiano, a companheira Vera, os teus familiares, o teu filho, que leva um duro combate às más administrações do dinheiro público em outras pontas deste País. Quero também aqui saudar os demais integrantes da Mesa e, em especial, o meu companheiro Prefeito desta Cidade, companheiro João Verle. Companheiros como o Jefferson Miola, que representa aqui o Ministério do Desenvolvimento Agrário; saudar também o Presidente do meu Partido, aqui, no Rio Grande do Sul, companheiro Davi Stival e, ao saudá-lo, saudar todas as demais representações político-partidárias que têm expressão nesta Casa e na vida política desta Cidade. Aos demais representantes de outros poderes e setores da vida da nossa Capital também a saudação, o respeito, em particular ao companheiro Deputado Estadual, ex-Prefeito de Porto Alegre, Raul Pont. Vejo aqui muitos militantes do movimento social, de longa história e trajetória - estou olhando para o Dr. Bruno e tantos outros.

Mas quero dizer da estima, companheiro José Paulo Bisol, ao que tu representas e quero dizer da importância desse reconhecimento neste ato de iniciativa do Ver. Juarez Pinheiro, mas, fundamentalmente, um ato desta Casa, da Instituição Legislativa do Município de Porto Alegre, reconhecendo o teu trabalho, a tua trajetória, dando-te o Título de Cidadão Emérito da Capital de todos nós, gaúchos e gaúchas.
Eu conheci o José Paulo Bisol, sem ele antes me conhecer. Eu o conheci como poeta em todas essas situações em que se tem da experiência de vida e da militância, das condições do Bisol, o Bisol nunca deixou de ser poeta, no verdadeiro sentido dessa palavra, que não é só fazer um verso, mas viver a vida na intensidade da sua realidade, do seu sonho, da utopia. Viver intensamente essa contradição da utopia, o sonho que todos nós temos de um mundo de justiça, de igualdade, de fraternidade fluído por todos e não apenas por alguns, com as enormes limitações do ser humano, as enormes dificuldades da realidade que precisa ser modificada, e modificada não apenas na sua superfície. Viver intensamente essa contradição foi sempre a lição que tirei das atitudes do Bisol, da sua presença na minha história de formação política de muito tempo, antes de conhecê-lo pessoalmente e de ele me conhecer.

Quero dizer, companheiro Bisol, dessa enorme estima! Tu és um mestre, um companheiro, um militante social. O trabalho que fizeste na Secretaria de Justiça e Segurança Pública, aqui no Rio Grande, não tardará para ser plena e justamente reconhecido como um trabalho pioneiro, desbravador. Muitas das questões que o companheiro levantou aqui, trouxe para dentro do Governo, o Governo assumiu, são hoje possibilidades enormes de serem trabalhadas na dimensão Federal por uma política que quer que a Segurança Pública não seja apenas um ato de repressão, braço armado do Estado, mas que seja uma função também social, embora as questões de segurança não sejam questões a serem tratadas apenas pelas polícias, embora o papel das polícias sejam da maior importância, e particularmente num Estado de Direito Democrático. Essa integração das ações, a formação qualificada dos policiais, homens e mulheres, o respeito aos Direitos Humanos, o controle externo sobre essas ações do Estado. Tudo isso o companheiro Bisol levantou, e tudo isso hoje é questão de debate nacional, e tudo isso eu vejo por dentro do Governo sendo trabalhado para ver se nós podemos, nessa dimensão, fazer avançar essa questão nessa propositura sob a visão que temos de um mundo de justiça e de igualdade, de um Estado sob controle público efetivo, de um Estado que deva funcionar bem, não para poucos, mas deva funcionar bem para todas e todos e em todas as circunstâncias.

Então, companheiro Bisol, é muito honroso ter podido estar neste momento aqui, mesmo que tivesse chegado alguns minutos atrasado, e por isso peço perdão, Sr. Presidente desta Casa, Ver. João Dib, por ter causado esse ligeiro transtorno. Mas tudo isso nos alegra imensamente, a oportunidade de aqui expressar nessas palavras singelas, o nosso respeito, a nossa estima e admiração pelo homenageado, companheiro e amigo José Paulo Bisol. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Antonio Dib): Recebemos do Deputado Henrique Fontana cumprimentos ao nosso homenageado. Também do Sr. Márcio Souza, da Secretaria Especial do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e do Deputado Ivar Pavan, Líder Estadual da Bancada do PT.

Neste momento, eu convido o Prefeito João Verle e o Ver. Juarez Pinheiro para, juntos, procederem à entrega do Título ao nosso homenageado.

 

(Procede-se à entrega do Título.) (Palmas.)

 

Agora o momento esperado por todos os amigos de José Paulo Bisol: ele usará a palavra na tribuna da Casa do Povo de Porto Alegre. A tribuna é sua.

 

O SR. JOSÉ PAULO BISOL: Exmo. Sr. Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, João Antonio Dib, Sras. Vereadoras e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais autoridades presentes.) Eu gostaria de fazer referência aos amigos, mas é complicado, porque todos os que estão aqui são meus amigos; teria de fazer uma referência ao Paulo Hecker, que foi quem ajudou o Juarez nesta homenagem.

A última vez em que estive aqui, a Câmara Municipal de Porto Alegre prestava uma homenagem a um dos meus melhores amigos, Synval Guazzelli. Eu estava quietinho, participando da reunião, e o Synval, que já carregava a morte consigo, fez diversas referências afetuosas e amorosas a meu respeito, e eu tive a profunda alegria de chorar.

Hoje, recebo mais esta comovente homenagem de um velho companheiro e amigo - a iniciativa é dele -, Juarez Pinheiro, que encontrei na estrada da vida, quando fazia uma campanha política, eu não sabia como fazer, pois não entendia nada da técnica eleitoral, e ele resolveu, não entendendo nada também, me ajudar.

Juarez é um homem reto, sólido, inteligente, percuciente, duro, quando necessário, e tem, como se dizia antigamente, a pertinácia das bielas. É uma pessoa, de uma tal dedicação silenciosa, permanente, que é difícil falar em público sobre ele sem se comover. A partir da bela alma de Juarez, começo a agradecer esta homenagem, prestada por uma Instituição extraordinária, histórica, que todos nós amamos, que é a Câmara de Vereadores de Porto Alegre. Instiga-me um pequenino registro que revela a elegância e a doçura das coisas da vida. Muitos Vereadores pensam o oposto do que eu penso e nenhum deles votou contra. Entendem! Entendem, a política tem de começar a entender isso, nós precisamos operar politicamente sem a violência do desafeto, sem o distanciamento, sem o empurrão, mas com elegância, com ternura. Considero o gesto desses Vereadores, meus adversários políticos, a partir de sua delicada exemplaridade, quase uma benção, um carinho, uma ternura.

Por isso não vou fazer um discurso político! Proponho-me a falar humildemente, mas o problema, Bruno, é que a humildade não se exibe. Gostaria de deixar o solene de lado. Muitos anos atrás, quando eu deixava, aposentando-me, o Tribunal de Justiça, no discurso, eu dizia que não sabia, e não sei, realmente, ser solene.

Eu não sei ser solene, a não ser com a solenidade do meu pai, hemiplégico, sentado numa cadeira, com esse olhar que olha o mar e suas naves, qualquer que seja a paisagem que se lhe ofereça. Esse olhar perdido, indissociável do silêncio me parecia solene! Saberia ser solene, talvez, como minha mãe, sentada na sua cadeira, com quase cem anos de idade e que expressava, minuto a minuto, um certo sentido de reverência à vida. E essa reverência me parecia solene. Então, com esse tipo de solenidade, a solenidade de um olhar hemiplégico perdido na distância e a solenidade de uma presença que reverencia a vida, eu gostaria de ser simples e humilde como ser família e, ao mesmo tempo coloquial e divertido. Como ser humilde? Isso me lembra uma cena de publicidade que todos conhecem. Parece-me que o nome dela é Daniela, uma mulher linda, com auroras incendiadas nos olhos, um nariz tipo ponto de exclamação, boca de polpas de moranguinhos, para não falar nas colinas redondas e nos vales úmidos! Lá está ela, no vídeo, para deslumbrar no clipe de “Você merece uma Kaiser”. E ela diz assim: “Ah, gente, eu não mereço”. Sabendo tudo, mas como se não soubesse. Esse tipo de humildade, eu não tenho como fazê-la, não tenho como realizá-la, o que é evidente por si mesmo. Estou querendo dizer que gostaria de ser humilde como os monges medievais copistas, esses, sim, eram humildes. Esses monges, segundo Jacques Barzun, copiaram não apenas os documentos religiosos que interessavam ao Cristianismo, como também os clássicos, os pagãos. E sabe lá o que é escrever horas e horas? Um deles deixou um manuscrito que dizia assim, reproduzido pelo Jacques Barzun: “Cuidado com os dedos! Não toques em nada que sirva para escrever! Não fazes a mínima idéia do que seja escrever! É uma tarefa excruciante: dobra-te a espinha, curva-te a visão, o estômago se enruga, e as costelas rangem!” E, com tudo isso, eles copiaram, e copiaram, e copiaram! E a eles nós devemos o deslumbramento dos conhecimentos e das artes dos nossos antepassados. Essa humildade, sim, não se exibe. Nenhum monge se exibe, sequer com o seu nome, nessas cópias. Esse tipo de humildade me comove. Claro que quando falo em copista, não me refiro a escritores como Paulo Hacker Filho, esse é um criador, não um copista, é um artista, um poeta. Esse me lembra um outro escritor, que ele consumia, durante um certo período da vida, de forma apaixonada, o Joseph Conrad. Lembra-me a definição de arte de Joseph Conrad, que dizia assim: “Ela, a arte, é um esforço obstinado para prestar a mais elevada espécie de justiça ao universo visível.” Se eu fosse prestar uma homenagem, Juarez, ao Paulo, eu citaria isso, porque ele é tipo do poeta, do escritor que, em escrevendo, realiza esse tipo de justiça. Isso me ocorre, porque lendo Robert Mandrou, “Magistrados e Feiticeiros na França do Século XVII”, nas últimas páginas, até na última página desse livro, o Mandrou, que é um historiador moderno, um historiador de mentalidades - esse livro é um exemplo de história de mentalidades - cita Montaigne e Malebranche. O Montaigne é dos anos 1500, Malebranche, acho, é dos anos 1600. Ele cita, porque, nos anos 1500, se torturavam e queimavam as feiticeiras e os feiticeiros, e, nos anos 1600, continuavam a queimar. Isso foi até o século XVIII e no XIX ainda há resquícios disso. Assim, na última página, o Mandrou cita Montaigne, porque este se refere ao julgamento das feiticeiras de uma forma crítica, e cita o Malebranche, porque, um século depois, Malebranche menciona também de uma forma crítica. Quando Montaigne escreveu, a mentalidade do mundo era a mentalidade do demonismo: satã era tudo. Diferente do que havia acontecido na Igreja ou na religião dos anos anteriores, que era mais de milagres, redenções e caridades. A mentalidade centrada em Satã matou milhares e milhares de pessoas durante séculos, séculos e séculos, até o século XIX. Pelo que Mandrou registrou: “De que adiantou” - ele não diz exatamente assim, mas sugere - ”a crítica de Montaigne e a de Malebranche?” Os juízes não leram. E o livro de Mandrou é no sentido de que centenas de juízes e de médicos da época, sem ler Montaigne e Malebranche, resistiram, nos julgamentos da inquisição, aos assassinatos institucionalizados pela mentalidade da época. A história mostra que eles, aos pouquinhos, foram transformando a judisprudência relativa às feiticeiras. Não se pense que os demonólogos eram ignorantes. Um demonólogo famoso se chamava nada menos que Jean Bodin, e, quando um tal de Vries escreveu contra a irracionalidade dos julgamentos, Jean Bodin respondeu com um livro inteiro com medo de que os juízes se deixassem influenciar e começassem a absolver as bruxas e os hereges. São essas pessoas, esses juízes, esses médicos anônimos que começaram a dizer: “Espera um pouquinho, isso aí não é sobrenatural, isso aí é natural, isso aí é histeria, é melancolia, é epilepsia, é doença mental, e assim começaram a estabelecer as causas, a substituir o sobrenatural pelo natural. Na medida em que eles foram fazendo isso, absolvendo, julgando improcedente, numa luta que durou séculos, o terror cristão diminuiu e eles acabaram vencendo. Eu gostaria de falar por essas pessoas, por esse juízes desconhecidos, que mudaram a cabeça de seu tempo, por esses médicos anônimos, e por meio deles lembrar a todos nós que, o que importa, é a mudança; fatalmente, o que importa é mudar. Ontem, hoje e amanhã, o homem não tem outra alternativa a não ser recriar-se na liberdade. Sempre de novo! (Palmas.)

A humildade dos esquecidos nos deixou esse recado: não chegamos ao fim das instituições. As instituições que nós alcançamos são maravilhosas, são efetivas, são bem pensadas, têm toda essa elaboração de séculos, mas a elaboração não terminou. Os Policiais, os Juizes, os Promotores de Justiça, todos os membros de instituições têm de ter presente isso: nós, sim, precisamos reinventar, refazer, é preciso, dia a dia renascer! Ser novo, ser jovem em cada instante. Acreditar no possível e no impossível. Nós fazemos o discurso de uma sociedade mais justa, mais humana, mais solidária, na base, às vezes, de uma idéia tradicional de progresso, idéia essa que a história não confirma. Não é verdade que caminhamos sempre para o melhor, como não é verdade que caminhamos sempre.

Então, nesta hora de afeto, de amor, ouvindo no fundo a voz de meu amigo Synval Guazzelli, eu quero deixar no coração de cada um de vocês uma terna recordação da necessidade de ser novo, da necessidade de ser auroral, da necessidade de amanhecer, de criar, da necessidade de querer bem a vida, agarrar-se à vida! Agarrar-se à vida, porque a vida vence. A vida vence. Não afirmaria que o bem vence, nem que vence o mal, mas afirmo, alegremente, nesta hora de confraternização, que a vida vence!

Com 75 anos e a experiência recente de um câncer, quero dizer para vocês que desejo viver um pouco mais; com o mesmo ardor, com a mesma crença e com o mesmo amor. Desejo seguir esse caminho - que, fatalmente, é o caminho para a morte - ao modo de um capitão-de-marinha, que tem o dever moral de ser o último a sair do navio em naufrágio, e se não der tempo, de naufragar com ele.

O homem, individualmente, morre. Mas em cada morte, a vida renasce, a vida vence, a vida muda, a vida recria, a vida inventa. E a cada dia que se abre diante de nós, abrem-se junto grandes possibilidades de mais amor, de mais ternura, de mais conhecimento, de mais poesia.

Uma vez eu citei, e vou repetir hoje, uma referência que li numa obra, não me lembro qual delas, de Slavoj Sizek. Há uma seita budista chamada Seita Marahuana, na qual o sacerdote se chama Bodyzatswa; e a destinação do sacerdote é passar de iluminação em iluminação. E a cada iluminação vencer os defeitos fundamentais do ser humano. Então, em uma iluminação vence o orgulho, em outra iluminação vence a mentira. E assim, de iluminação em iluminação ele chega àquela iluminação que vai eliminar o seu último defeito, que é o egoísmo. Quando ele eliminar o último defeito, essa iluminação vai transferi-lo para o nirvana, para a paz de Deus, o descanso da eternidade.

E o que acontece? O Bodyzatswa ilumina-se, elimina o egoísmo e não pode passar para o nirvana, porque sem o egoísmo ele só pode passar para o nirvana se os outros seres humanos passarem com ele. Então, nós nunca chegaremos, Bruno, ao nirvana, porque não somos Bodyzatswa. E um Bodyzatswa nunca chegará ao nirvana porque, não sendo egoísta, não passará para o nirvana sem levar a nós outros, todos. A condição de possibilidade do nirvana é a sua própria condição de impossibilidade.

E é esta a última mensagem - essa eu sei, um pouco tortuosa - que vou deixar hoje aqui, o ser humano fatalmente se depara com uma condição de possibilidade que é, (usando essa expressão de Kant), a própria condição de impossibilidade. Nunca chegaremos lá. Nunca chegaremos à sociedade solidária, humana e fraterna. Sempre haverá um resto, uma falta ou um excesso, que não nos permitirá essa felicidade.

Então, nos toca saber disso, meu amigo Olívio, quando governamos, saber disso quando escrevemos, saber disso quando convivemos, quando amamos, quando discutimos, saber disso, saber que sempre haverá, Jorge, um excesso ou uma falta, algo que não nos permite a plenitude. E a vida é esse incessante buscar a plenitude, que jamais será.

Em suma, ao modo de Alain Badioux, é preciso buscar os impossíveis. Não te apequenes, não te diminuas, não te limites buscando o que está ao teu alcance. Busca generosamente o melhor da vida, o melhor da humanidade, busca a sociedade solidária, humana, justa, generosa, busca a justiça, busca o amor, a mediação, o equilíbrio, a compreensão, busca a ternura, vence, dia a dia vence, vence com a vida, sem a ilusão de chegar jamais, porque isso não nos pertence.

Com essa mensagem do Bodyzatswa Marahuana, faço um último registro. É impressionante para mim ver o Olívio ali. Vocês não imaginam a dificuldade - ele teve de vir correndo de lá, vai voltar correndo, já sei disso – e veio aqui para esta solenidade simples, esta homenagem ao seu amigo, que é, afinal de contas, a maior láurea que de minha vida. E esta láurea agora é coroada, coroada, Juarez, nós dois somos honrados com isso, além da própria Casa, com a presença deste homem, que me manteve – pensem bem – na Secretaria de Segurança e Justiça (Palmas.) durante quatro anos, quando dia a dia, forças conhecidas da nossa sociedade tentavam me derrubar, e se ele atendesse, ele seria beneficiado! Mas ele acreditava no que eu acredito; nós lutamos juntos, Juarez, não tínhamos toda a verdade, não a teremos nunca, e às vezes se tem uma verdade para a qual o contexto e, então, até a verdade também mente. Tínhamos a fé, Olívio! A crença, o gosto da vida, na boca, na saliva, na palavra! Tínhamos a consciência da necessidade de mudar!

Isso, sim, num dia de justiça terá de ser dito, porque era a nossa diferença, carregar a vida por acreditar nela, fazer política para recriar a vida, ainda que às vezes seja preciso enfrentar o próprio corpus, a corporação. Não é só o PT que tem esses gestos. O Brasil é um País de grandes momentos, e eu acho que, ao receber essa homenagem - repito, a maior láurea da minha vida -, o melhor que posso fazer com as palavras é buscar esse modo de deslizar a mão pelos cabelos de cada amigo e dizer: pode ser que a verdade não vença; pode ser que o bem não vença. Mas eu asseguro a vocês: a vida vence! E vence na beleza, no amor e na justiça que nunca acabaremos de alcançar. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (João Antonio Dib): Encaminhamo-nos para o final desta solenidade, e o fazemos agradecendo. (Saúda novamente os componentes da Mesa e os demais presentes.) Saúdo especialmente o Senador José Paulo Bisol, nosso homenageado, e os seus familiares. A todos os senhores e senhoras o meu muito obrigado. Saúde e paz!

Neste momento, convidamos todos os presentes para, em pé, ouvirmos o Hino Rio-Grandense.

 

(Ouve-se o Hino Rio-Grandense.)

 

Agradecemos a todos pela presença e damos por encerrada a presente Sessão Solene.

 

(Encerra-se a Sessão às 21h04min.)

 

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